Gritos, aplausos. Uma plateia frenética e agitada. No palco um homem, um microfone, uma equipe. No resto do Brasil milhões de radiouvintes. Os programas de auditório. Um gênero que marcou época no velho rádio. Os programas de auditório eram muito comuns em muitas emissoras de rádio entre os anos 30 e meados de 60. Consistiam em um desfile de músicos, cantores, cantoras, além de radioatores interpretando pequenos esquetes tudo em meio a vibrante participação da plateia. Os programas eram conduzidos por um radialista criativo e experiente, chamado “animador de auditório”. Muitos animadores de auditório se consagraram, porém, entre todos eles, o mais famoso foi certamente Cesar de Alencar. Este cearense de Fortaleza, que chegou ao Rio de Janeiro em 1939. Com sua voz e estilo cativantes, foi campeão de audiência no rádio por mais de 15 anos, popularizando, no Brasil, fórmulas que faziam sucesso nos Estados Unidos.
Formado em Letras, logo que chegou ao Rio foi trabalhar na Rádio Clube do Brasil, quando recebeu um empurrão de um radialista famoso, do qual já falamos várias vezes aqui: Renato Murce, esse descobridor de talentos, que convidou Cesar para fazer um programa diário como locutor. Imprimindo sua instintiva marca, Cesar logo iniciou uma carreira exitosa. Criou com enorme sucesso, o primeiro concurso de músicas de carnaval em 1942.Ao lado de Herivelto Martins, Benedito Lacerda e Francisco Alves. E chega o ano de 1945. Importante na sua carreira pois ele é contratado pela Rádio Nacional, quando passa a trabalhar em locuções comerciais e narrações, além de participar novelas.
Mas é na tarde de um sábado com o auditório lotado que se ouve pela primeira o prefixo musical que ficaria famoso, de autoria de Haroldo Barbosa com os Quatro Ases e um Coringa.
O Programa César de Alencar se transformaria no maior programa de auditório de todos os tempos, onde se apresentavam grandes astros e estrelas. Entre as inovações que trouxe para o rádio brasileiro estava a entrevista ao vivo por telefone, recurso usado até hoje.
Em seu programa, além dos astros nacionais, apresentavam-se também artistas mundiais, como Gregório Barrios, Yves Montand, Charles Trenet e outros. O programa começava às 14 e ia até 19 horas de todos os sábados.Cesar conduzia tudo com talento. Possuía uma memória incrível. Nessa época eu trabalhava na Nacional e fui testemunha disso. Sabia de cor todos os textos comerciais. Anunciava as atrações sem recorrer aos scripts, controlando o tempo e o ritmo do programa com maestria.
Hélio do Soveral, novelista e produtor de grandes programas, como o Teatro de Mistério, era o roteirista de César, cabendo ao maestro Chiquinho fazer os arranjos musicais. A cantora Marlene, vinda do Cassino da Urca, foi praticamente lançada em rádio no programa. Mas Emilinha Borba era a grande atração. Ai começaram as disputas entre as fãs das duas cantoras. Para evitar confusão, a direção da Nacional determinou: Marlene fica no programa Manoel Barcelos e Emilinha no César de Alencar.
Se apresentava sempre vestindo uns conjuntos de calça igual à camisa. Cor única, feitos do mesmo tecido. Era alto e magro. Pernas longas e um andar característico, que lhe valeu o apelido de Cavalete. Tinha também grandes e arrebitadas orelhas, que valiam os apelidos de Orelha e Abano. Ele não se importava e assumia, tanto que gravou uma canção : "Fale na orelhinha de cá" em dueto com Heleninha Costa. Embora não se considerasse um cantor, gravou vários discos em discos 78 rotações. E participou de diversos filmes. Sempre fazendo sucesso.
Na eleição presidencial de 1960 gravou jingles que apoiavam João Goulart como vice-presidente do candidato Jânio Quadros. Vida que segue, veio o Movimento Militar de 1964. Intervenção na Rádio Nacional. E Cesar de Alencar segundo conta a História, vislumbrando a possibilidade de alcançar a presidência da emissora, indica para os militares os funcionários e artistas de esquerda, que foram todos afastados e depois demitidos.
No final dos anos 80 voltaria à Nacional com um programa de rádio já então dentro dos novos padrões do rádio, limitado a um pequeno estúdio, muito diferente do clima quente, vibrante e barulhento dos velhos programas de auditório, que ele consagrou e onde imperou.
Morreu no Rio de Janeiro em 1990 e, lamentavelmente, hoje vem sendo lembrado mais por sua colaboração com os órgãos de repressão a partir do Movimento Militar de 64, do que por seus feitos no rádio. Mas faço aqui justiça a este grande radialista, copiado no velho rádio à exaustão e espelho de muitos programas de televisão dos tempos de hoje. Ave Cesar!
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4 сен 2024
