Essa é uma das gravações que infelizmente não puderam entrar em "Um Tributo a Wilson Batista" ( • Murilo Cleto - Um Trib... ) por falta de um acordo com a editora que administra seus direitos autoriais.
Mas, se ela é de Max Bulhões e Milton de Oliveira, o que estaria fazendo em um produto dedicado a Wilson? Bom, senta que lá vem história.
Sabe-se que essa canção nasceu de uma parceria entre Wilson e Max, isso é fato. Mas em 1937 ela foi gravada por Patrício Teixeira, com Wilson Batista substituído nos créditos por Milton de Oliveira. Ele ficou indignado. Segundo consta, Max admitiu a sacanagem, mas disse que era por uma boa causa: Milton era amigo de Patrício e tinha ajudado a desenrolar a gravação. Mas que, nas próximas gravações, o crédito seria dado corretamente para Wilson, o que nunca aconteceu.
Essa era uma prática muito comum da época: intermediários de grandes cantores ou mesmo os próprios cantores às vezes saíam como compositores das músicas, mesmo sem tê-las escrito. Os verdadeiros autores acabavam concordando porque a gravação era a única chance de a música fazer sucesso. Moreira da Silva, por exemplo, fazia muito isso. “Acertei no Milhar”, que ele começou a cantar já nos anos 1930, foi feita por Wilson, mas o autor concordou em ceder 50% dos direitos para Morengueira - que só não ficou definitivamente com os créditos porque devia para Geraldo Pereira e lhe cedeu sua parte, com a anuência de Wilson.
Segundo Kid Pepe, da rádio Cruzeiro do Sul, Max, sabendo que estava errado, pagou trinta mil-réis para Wilson em forma de reparação. Uma das razões do descontentamento de Wilson é que “Não Tenho Lágrimas” foi um grande sucesso, inclusive internacional. Foi gravada por Nat King Cole, por exemplo - e em português! E aí fica a questão: o fato de Wilson ter aceitado o dinheiro significa concordância com a cessão da autoria?
É muito difícil saber o que realmente aconteceu. Por um lado, Wilson não teria motivo para mentir, inclusive porque ele vendia muito samba mesmo. Ele abriu mão diversas vezes da autoria de músicas por uns trocados. Por outro, pode ser que o sucesso internacional da canção o tenha feito mudar de ideia. Ou, ainda, que os termos dessa negociação, muito nebulosos, tenham deixado margem para cada um interpretar como queria.
Fato é que Wilson Batista nunca engoliu o desfecho dessa história e passou o resto da vida reclamando a autoria de "Não Tenho Lágrimas" e chamando os dois autores creditados como "traidores" e "ratos".
Quem conta esse episódio em detalhes é Rodrigo Alzuigir na sua monumental biografia "Wilson Baptista: o samba foi sua glória".
O autor desse arranjo originalíssimo, que acho que mergulha na essência desta linda canção, é o professor @BetoChedid. Graças à sua generosidade, ele pode ser aprendido passo a passo, inclusive com algumas variações, em • MQA #169 - como tocar ...
11 мар 2024